Talvez você já tenha passado por isso, de olhar pela janela do ônibus, do carro, do banheiro de um shopping ou mesmo da sua casa, e ver aquela gente sem rosto. Quer dizer, aquela gente que você não consegue definir se são ou não seus iguais, e essa coisa toda de ter compaixão e amor ao próximo. Comigo isso acontece sempre. Eu tenho a mania de ficar olhando para as pessoas tentando me encontrar de alguma maneira nelas. Um dia isso não vai dar certo. Um dia talvez alguém queira - e faça questão - que eu me explique. Um dia alguém se declara. É que eu estou em São Paulo. Nessa cidade, olhar para os outros é tão comum quanto esperar condução. Esperamos, esperamos, esperamos e para consumir o tempo, vigiamos o próximo.
Se eu morasse em Chicago ou em qualquer cidade americana eu seria preso. Ainda mais com meu sobrenome. Mas eu tomo cuidado. É claro que quando fico contemplando um sujeito (homem, mulher, criança, jovem ou velho) eu dou uma enganada, olho pra baixo, para os lados, finjo estar hipnotizado. Eu atravesso a pessoa com o meu olhar e consigo ver um outro adiante. E se for necessário, um outro e mais outros e outras.
A questão é que eu não consigo parar de praticar esse esporte de ver, conectar, compartilhar e mesmo assaltar o desejo dos outros pelo acesso ao globo ocular. Confesso, sem nenhum pudor, que faço isso por interesse. Me interessa saber do outro suas vontades e anseios no mundo. Apenas para descobrir que eu sou igual. Tolo igual. Ridículo igual. Amorosamente igual. Estonteantemente igual. Genialmente igual a todo mundo. Pra não entrar nessa de me achar superior e ficar de uma janela qualquer tentando compreender o que será que deu nessa gente de existir assim, tão de repente, e sair de lá para cá e de cá para lá, vivendo sei lá para quê. O que me incomoda é quando ninguém me vê.